Eu era irritante.
Era o barulho que eu fazia ao
comer,
Era por falar demais.
Era por pensar demais.
Por ser “fresca demais”.
Nada estava bom.
Escutei isso durante semanas, e
delicadamente, sutilmente, tentava reverter a situação.
Em silêncio, eu implorava que
isso mudasse,
Estava cansada de tanto desamor.
Eu me podava, ainda mais.
Eu não ouvia uma palavra de
afeto, um elogio.
Toda frase era uma piada ou uma
agressão verbal ‘de leve’.
Eu pensava: se o amor está nas
palavras,
Onde está esse amor agora?
Não me lembro mais o que é ser
elogiada por alguém.
Não sei mais o que é me sentir
querida, especial, fazer falta.
Me olho no espelho e parece que
eu enxergo só aqueles defeitos que ele não cansa de enumerar.
O que sou eu afinal?
Por que insiste em ficar onde nada
parece não te satisfazer?
Eu cruzo a cidade inteira para
ficar umas horas ao seu lado,
Eu sempre te elogio, sempre te olho
como nunca olhei para outro alguém,
Eu expresso meu carinho, sinto
saudades, corro atrás,
E apesar de todos os meus
defeitos, aos quais não nego a existência,
Dou o melhor de mim,
Entrego meu coração, abro as
janelas de par em par.
E você?
Toda vez que eu subo naquele ônibus,
Vejo um olhar de quem se vê livre
de uma obrigação,
Todas as noites andando sozinha
pelas ruas,
Só Deus guia os meus passos,
Sim, aquele mesmo Deus que você
desdenha.
As lágrimas, agora desenfreadas,
caem com força pelo rosto,
Destilando no peito as palavras
que pesam mortas na garganta,
Não podem ser ditas, pois não
farão efeito algum.
Não serão ouvidas, pois não serão
compreendidas.
Eu sou irritante,
É o barulho que eu faço ao comer,
É por falar demais,
É por pensar demais,
É por ser fresca demais.
Me explica que amor é esse,
Que não fala o que sente,
Não se elogia,
Não se cuida,
Não se rega?
Que amor é esse que só vê o que o
outro tem defeituoso,
Que amor é esse que me obriga a
deixar de ser o que sou,
Pra me tornar aquilo que você
quer?
No meu pranto silencioso, partilho
com a minha alma os pensamentos que me ferem,
Não há amigos para chorar,
Não há um ombro que me console.
E o Único que me mantém de pé,
É aquele mesmo Deus do qual você
quer me afastar.
Talvez, eu não queria admitir
para mim,
O quão próximo de um adeus eu
possa estar.
Kelly Christine