2012. É verdade. Eu não tinha muita expectativa que esse ano fosse diferente dos anteriores. Mas isso também já foi demais.
Acordei como acordava todas as manhãs. Levantei, fui tomar meu banho, e me arrumar para ir ao trabalho. Penteava o cabelo e encarava no espelho, alguém que parecia tão familiar e ao mesmo tempo tão estranha: o meu olhar, que não se permitia mais sonhar.
Lá vou eu apressada, tomar o ônibus que já partia, para + uma viagem de 1h. Sonolenta, recostava a cabeça e me permitia sonhar. Pensava e pensava e tudo aquilo que desejava: os meus problemas resolvidos, as pessoas que eu amo por perto, os sorrisos. Ah, os sorrisos! Como eu queria que fossem intensos como eram meus pensamentos naquela pequena grande 1h que me separava do meu destino. Fechei os olhos mais uma vez. E entrei no universo onde tudo era possível.
Acordava quase próxima ao ponto onde precisava descer. Saltei. Caminhei aquele mesmo trecho curto, rumo ao edifício comercial que trabalhava há + de um ano já. Cumprimentei o porteiro, que me olhou de maneira estranha. Aquilo não passou desapercebido por mim. Continuei. O técnico da empresa de monitoramento segurou o elevador, enquanto eu apressava o passo para não tomar o tempo dele. Agradeci, e acionei o botão que me deixaria no oitavo andar. A viagem curtinha entre um andar e outro, me lembrou um conto que já relatei a vocês, sobre ao abrir a porta do elevador, todo o mundo que eu desejei estivesse por trás dela. Imaginava isso todos os dias. Mas nunca aconteceu. Agora muito menos.
Enfiei a chave na porta, notei luz. Estranho. Não era hora de nenhum deles estar no escritório. Abri, e mal cumprimentei ambos desejando bom dia, que um deles me chamou a sala. Foi só o tempo de colocar minha bolsa sobre a mesa. Sentei a frente deles. Uma atmosfera pesada, de que algo ruim estava para acontecer. Mas no primeiro dia útil do ano? Seriam capazes de tamanha crueldade?
Foram. O mesmo discurso de todas as vezes: estavam com problemas financeiros, corte, excelente trabalho, excelente funcionário, e blá blá blá. Eu encarava o aviso prévio assinado por ambos na minha frente, muda, com os pensamentos em meio a uma neblina tensa. Assinei. Entreguei a chave da sala na mesa deles, sai pela porta sem olhar para trás.
No elevador, desespero. O que seria de mim agora, desempregada mais uma vez? Olhei para o porteiro e finalmente entendi o seu olhar. Acenei levemente com a cabeça, puxei meus fones de ouvido, a música corria, mas eu não conseguia me concentrar nela. Me dirigi ao ponto. O ônibus de volta não demorou nada e veio vazio. Paguei ao motorista, e sentei-me no canto mais isolado do coletivo. Prendi o máximo que pude, mas elas rolaram pela minha face. O caminho todo um silêncio na alma. Era como um condenado a morte seguisse rumo a forca: já estava conformado, apesar da dor.
Saltei a 3 quadras de casa. No caminho, eu já sabia o que me esperava: ela. É. Sabia que ela me responsabilizaria, me chamaria de incompetente e outras coisas que não adiantaria argumentar, por mais que eu quisesse. Ela que queria que 2012 eu estivesse longe da casa dela, agora, fiquei ainda mais refém da boa vontade de alguém que não age como mãe.
Cheguei em casa, olhos vermelhos. Ela já atira: “ te mandaram embora?” Diante da minha afirmação positiva, o discurso que eu já esperava. Me calei. Tranquei-me no quarto e desatei a chorar.
Enquanto escrevo este texto, lembrei-me do dia 30/12 que passei em casa descansando. Toda cidade estava em festa. A área comercial celebrava um ano que foi bom para uns e conciliador para outros, e abria novo espaço para 2012 que estava chegando finalmente. Como celebravam isso? Como todos os anos: a chuva dos papéis rascunho triturados na maquina de documentos. No centro de Santos, na Avenida Paulista, o hábito já tinha virado tradição: a chuva do papel picado no alto dos prédios comerciais, significava que uma etapa se finaliza, e outra etapa começa.
Engraçado ter essa lembrança agora.
O ano mal começou. E já vejo minha vida, tão picada, quanto esse papel.
Kelly Christine
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