Querido Deus,
Essa carta segue para agradecer a vida curta que me deste. Sofria muito em conseqüência de problemas que jamais entenderei como começaram e porque nunca terminaram. Fiz amigos, fiz inimigos, gente que adorou me conhecer e gente que me odeia só de ser pronunciado o meu nome. Foi uma vida curta Senhor.
Muitas brigas, amigos falsos, amor ilusório e platônico, família que só serviu de geradora de vida, não de estrutura ou base social. Conheci muitos momentos felizes, mas no geral, a vida em si foi uma droga, e nada aprendi com ela, só mesmo a sofrer, chorar, me lamentar. Carreguei no coração várias feridas, lembrava a cada passo que eu dava, os erros que tinha cometido e os que nunca sonhei em fazer, mas paguei por eles mesmo assim. Lembrei-me de todos os dias que me sentia sem chão, vazia, querendo apenas um abraço para ter forças de continuar a passar por essa vida curta. Não ganhei nada disso, apenas mais uma resma de peso para carregar. Mais cicatrizes, mais problemas. Acreditei no amor, acreditei nos ‘instantes mágicos’ e percebi que fora tudo palavras bonitas, porém vazias, de um livro qualquer de auto-ajuda. Apenas. Respeitei meu caráter, tive fé no amanhã, vivi honestamente e dignamente. Nunca roubei, nunca me droguei, sempre tive uma conduta certa. De nada serviu tudo isso. Foi uma vida curta, monótona, sofrida e te agradeço mais uma vez meu Senhor, que essa vida acabou. Hoje meu corpo jaz tranqüilo, abaixo de uma lápide fria; tão fria quanto os abraços que esperei em vão receber, tão fria quanto o carinho dado pela pena da “menina pobre e traumatizada”, uma pena que eu nunca roguei pra mim.
Agradeço Senhor por ter dado fim a cada lágrima derramada em vão, em nome dos sonhos que não realizei, das muitas coisas que deixei de fazer, dos amigos que precisava e não tive, do amor da minha família que queria tanto e nunca consegui, das minhas milhares de contas que nunca tive dinheiro para pagar, por cada aborrecimento e descrença que tive no dia de amanhã, trabalhando em um emprego que não me dava nenhum reconhecimento, nenhuma alegria. Obrigado Senhor. O corpo sofreu como nunca o que a alma sentia calada, trancada dentro de si mesma, em silêncio para ver se passava despercebida. Ele continua repousando em paz, abaixo da lapide fria, enquanto a alma conhece o novo mundo, enxerga as cores de outra forma, se liberta, se permite, acredita em si mesma. Não quer mais olhar a vida curta que tinha. Não quer mais olhar para trás, aquele corpo que ninguém jamais amou foi abandonado por ela. A alma livre, como o vento.
Obrigado Senhor. O Anjo da Morte repousou suas asas suaves sobre mim, e finalmente me fez conhecer uma paz que jamais havia experimentado antes. A paz do silêncio, da isenção de explicações. Uma paz que só conhecemos uma vez na vida.
Obrigado Senhor,
Precisei chegar ao fim da vida para obter tudo o que queria.
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